segunda-feira, 26 de setembro de 2011

FÁBULAS BRASILEIRAS

O Brasil assemelha-se a um país de conto de fadas, mas ao contrário das fábulas de Esopo as histórias daqui não tem moral e nem final felizes. Aqui as histórias só terminam bem para as bruxas e para os lobos-mau.

Assistindo essa semana o Bate Bola na Espn, um dos comentaristas, indignado, desabafava pela precariedade do transporte público em São Paulo: "Uma cidade feita para carros. Uma pessoa por veículo!", desabafava. E continuou a discussão relembrando projetos de alguém, planejamentos de não sei quem, obras que nunca começaram e outras que nunca tiveram fim.

Mas este é o Brasil, impávido e colosso. Eu me lembro que nos anos 80 muito se falava sobre a reserva de ferro de Carajás e o fato dela ser a maior do mundo. Naquela época eu já me questionava como um país de extensão continental, vítima do cartel árabe e americano do petróleo e com a maior reserva de ferro do mundo dependia tanto do transporte rodoviário e da indústria automobilística. Por que não tínhamos estradas de ferro como os EUA e a Europa? Claro, eu tinha apenas vinte anos e não conhecia o maquinismo entranhado na nossa história sócio-econômica; da rendição política do país aos interesses dos senhores da GM, da Ford, da Crysler e das gigantes petrolíferas Esso, Shell e Texaco em desovar seus estoques no Terceiro Mundo, tornando-nos serviçais dos seus produtos e nos deixando como herança os frangalhos do nosso transporte público.

Das fábulas brasileiras, uma delas deu origem mês passado ao livro "O Ladrão do Fim do Mundo" que conta a história de como no início do século XX o Brasil que produzia 95% da borracha consumida no mundo passou a comercializar apenas 2,3%, depois que um ladrão inglês chamado Henry Wickham contrabandeou 70 mil sementes da seringueira brasileira para as colônias do Império Britânico dentro de um camarote lacrado em um navio que foi inspecionado pelas autoridades brasileiras em Belém do Pará, e as árvores começaram a produzir lá do outro lado do mundo.

Mas isso é a apenas uma parte da história dos marginais que se entranharam no país que já abrigou um nazista e criminoso de guerra (Joseph Mengele), um assaltante procurado pela Interpol (Ronald Biggs), um ditador sanguinário (Stroessener), um mafioso (Tomaso Busceta) e recentemente um terrorista italiano (Cesar Battisti). Tudo isso, claro, sob os auspícios da lei.

Ironicamente esta lei que protege bandidos não é usada de maneira eficaz para proteger nossas crianças e adolescentes, garantido-lhes a dignidade e cidadania merecida. Dia desses, enquanto almoçava e ouvia as tele notícias fui bombardeado pelo descaso social em que vivemos: numa escola um aluno foi eletrocutado porque tocou numa parede que dava choque; em outra, os alunos bebiam água em panelas porque não haviam copos. As imagens falavam por si só. E, claro, as condições são precárias, mas não é por falta de dinheiro público e sim porque reformar escolas neste momento não trás vantagens políticas, pois este não é um ano de eleição. Assim, a ideia política é a mesma de 30, 40 anos atrás: manter as obras públicas num nível de precariedade e a educação das crianças num patamar subdesenvolvido para garantir o cabresto de votos nas eleições futuras.

Assim se constrói um país de analfabetos. Assim fomos ao longo da história sendo segregados de nossa intelectualidade e de nossa cultura. Usurpados de nossas criações como fazem ao pioneiro da aviação, Santos Dumont, com relação aos irmãos Wrigth e ao padre José Francisco de Azevedo que inventou a máquina de escrever e depois perdeu o direito de patenteá-la, pois um americano roubou-lhe a ideia e a patenteou sete anos depois. Se não temos respeito por nossa identidade, quem irá nos respeitar?

Das sementes contrabandeadas da floresta ao domínio da U.S. Steel que chegou a ser dona de 70% do ferro da Carajás, o país mudou muito, mas não mudamos nosso caráter. Antes éramos saqueados apenas pelos colonizadores que nos levavam a riqueza da terra e ficávamos como miseráveis ilhados em nosso próprio reduto; agora aprendemos a saquear a nós mesmos desviando recursos da saúde, da educação, da segurança pública e aumentando os impostos na mesma proporção que aumentam o número das aves de rapina.




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