terça-feira, 6 de dezembro de 2011

EXTORSÃO: UMA INSTITUIÇÃO NACIONAL

Quando Steve Jones e Paul Cook, do Sex Pistols, estiveram no Brasil em 1978 e saíram pra dar uma  volta no Rio com José Emílio Rondeau estranharam a figura do flanelinha recebendo trocados para "guardar" carros. Imagine: os ícones do movimento punk espantados com a institucionalização da extorsão na figura do flanelinha amparada pela venda nos olhos da justiça brasileira.

Juntando toda a banda terceiro-mundista com a herança pré-colonial de nossa descendência pouco nobre de degradados e amancebados, o que nos diferencia de uma Paris do século XVIII é que hoje existe um saneamento razoável nas ruas e as mães não dão luz  nas feiras sob barracas de peixe, cortando os cordões umbilicais com  facas sujas de vísceras.

De trocado em trocado os flanelinhas transformaram a guarda de carros em um negócio sindicalizado que aliado à falta de oportunidade de emprego agregou à classe uma turma de vagabundos e desocupados que transformaram o negócio numa oportunidade de extorquir motoristas em estacionamentos públicos e pedágios em semáforos, ao cúmulo de cobrarem 100, 150 reais por uma vaga em São Paulo.

Eu sei que tem quem se sensibilize com isso, mas eu não. Não estudei pra ser trouxa, mas até porque faço minha parte antecipada: o imposto do meu salário é descontado na fonte. Quem devia estar preocupado, que são os políticos e governantes,  não estão. Embutiu-se na sociedade o hábito de que os cidadãos assumam as lacunas deixadas pelas más gestões públicas enquanto a cada eleição o que se vê é a fanfarronice do desperdício do dinheiro arrecadado em impostos ir para a latrina das promessas de campanha. Basta buscar na memória recente do país.

Mas se não se punem os graúdos, quanto mais os miúdos. Eu me lembro de folhear livros de Direito na biblioteca de meu pai, num tempo em que buscava minha vocação profissional, e ter lido, num antigo Código Civil a respeito da detenção por vadiagem e outras contravenções. Até pensei que essa lei nem mais existisse, mas existe. Surpreendentemente, o capítulo VIII das Leis das Contravenções Penais lista como passíveis de punição as seguintes contravenções, entre outras que eu também julgava extintas: jogo do bicho, importunação ofensiva ao pudor, embriaguez, servir bebidas alcoólicas a quem se encontra embriagado, pertubação da tranquilidade, etc.

Apesar de soar irônico, este retrato é extremamente perturbador, na medida que coloca as leis vigentes do país num limbo, num plano de arqueologia. E para fazê-las cumpri-las as instituições mais sérias tem que garimpar verdades, direitos esquecidos por décadas de descaso contra a sociedade.

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