quinta-feira, 29 de outubro de 2009

QUANDO FAGNER SE CHAMAVA RAIMUNDO


Vivi em Fortaleza durante quase uma década entre o final dos anos 70 e boa parte dos 80 e dentro deste período presenciei o boom da música cearense onde a figura de Fagner se destacou entre outros grandes nomes. O primeiro disco de Fagner que ouvi foi o Quem Viver Chorará, de 1978, onde o naipe de cordas associado às letras das canções e a interpretação marcante do cantor me chamaram atenção. Daí resolvi adquirir tudo que o cara tinha lançado pra trás e virei fã.

O que me chama atenção das gravações desde o Manera Fru Fru até o Qualquer Música é a constante renovação de arranjos, evitando o lugar comum da rotulação do cantor a um determinado estilo. Deste período, e cito apenas os meus preferidos, o Ave Noturna apresenta o cantor ainda verde, começando a explorar o potencial de sua voz, muito ligado ao Ceará, tocando um violão agressivo e flertando com bandas "cabeças" como a participação do grupo Vímana; o Raimundo Fagner de 1976 com sua primorosa sonoridade com músicos do primeiro escalão da época e arranjos de Wagner Tiso; o Quem Viver Chorará, onde o cantor explora sua voz lamentosa entre os naipes de cordas e musicalidade variando do chorinho e a música cigana, pois Fagner já flertava com a música espanhola; e por fim, o Beleza, fruto de uma parceria de arranjos com João Donato, recém chegado ao Brasil, onde predomina uma natureza acústica e límpida de teclados, com Fagner no auge de sua voz.

Nesta época, a CBS entregou a Fagner a Direção Artística do selo Epic e dali foram lançados vários artistas nordestinos que explodiram no cenário nacional como Elba Ramalho, Zé Ramalho, Geraldo Azevedo, entre outros e também alguns cearenses que já eram parceiros do cantor, como Petrúcio Maia e Nonato Luís. Foram anos de muita produção musical, pois além de sua carreira-solo, Fagner aproveitou-se do sucesso que detinha no mercado fonográfico naquele momento e realizou diversas participações especiais nos discos produzidos na Epic e também em discos de outras gravadoras; além disso produziu e lançou o LP Soro, um projeto audacioso que uniu entre outros artistas, o próprio Fagner, Belchior, Ferreira Gullar, Nonato Luis, Abel Silva, Patativa do Assará, Núbia Lafayette, e que junto com o disco veio um encarte em formato de livro com poemas, gravuras, letras em produção, etc

Desta intensa produção ficaram registradas muitas gravações que se transformaram em raridades como: No tempo dos Quintais ( com Sivuca ), Passarás, Passarás, Passarás ( com Teti ), Oferenda ( com Clodo ), Quatro Prantos ( LP Nonato Luis ), Reflexos do Baile ( LP Petrúcio Maia), Traduzir-se ( com Nara Leão ) e muitas outras.Dois anos depois do Beleza, Fagner foi a Espanha e gravou 3 discos: o Traduzir-se, o Raimundo Fagner em Español e o Homenagem a Picasso.

Depois gravou alguns discos meia-boca e acabou seguindo o conselho de Roberto Carlos de "parar de gravar música de universitário e fazer música pra vender disco" e caiu na mesmice de onde nunca mais saiu. Mas aí, parafraseando Charles Gavin, é outra história.

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